11 de agosto de 2013

Vinte e três e doze

O meu tempo nunca soube ser tempo, nunca soube esperar.
Ansiou pelo tempo que vinha sem saborear o tempo que tinha.

Desperdiçou-se, trôpego por si mesmo, correu sem jeito nem utilidade.

O meu mundo não sabe ser mundo sem ti.
Perde-se, desorienta-se, não sabe onde se agarrar.
Espera pelo tempo que não o sabe ser e que corre sem saber quando parar.

O meu mundo pára, perde-se no tempo que passa, mas passa mal.

O relógio toca.
O despertar pelo despertador em nada desperta o meu mundo.

Acordo novamente só.

25 de maio de 2013

Duas e vinte e oito

Eu não te sei explicar a lágrima que rola pela minha cara.
Não te sei explicar o vazio que faz gelada a noite quente.

A tua ausência faz-me incompleta. Há tempo de mais.
O relógio que carrego ao peito parou. Deixei de lhe sentir o tic e o tac, os ponteiros a seguir, um mais rápido outro mais lento, mas carregados de esperança.

O meu relógio parou e o meu coração asfixiou.
Já não sei respirar. Já não sei apreciar as estrelas que brilham e a brisa no ar.

Estou em queda livre.
O ar passa por mim tão depressa que me é impossível tomá-lo para mim.
Nunca mais chego ao chão.

Tomas-me nos teus braços?

12 de maio de 2013

Zero e vinte e um

Não preciso que me entendas.
Não preciso que te acalmes, que sossegues e voltes a ser o mesmo de sempre.

Não. Eu preciso de ti assim.
Da tua raiva, da tua revolta, cheio da adrenalina que te tolda os movimentos e te faz perder o controlo sobre ti mesmo.

Fode-te.
Grita comigo, empurra-me, enerva-me!
Faz-me largar uma lágrima, cerrar os dentes, fechar o punho e bater-te no peito com toda a força que me resta. Leva-me assim contra a parede e perde-te comigo. Liberta-te comigo.

Passa-te e fode-me.
Ou acalma-te e beija-me.

Mas ama-me. Estava cansada da tua apatia.

6 de maio de 2013

Vinte e três e quarenta e dois

É fácil sentir o fim.
Ele vem e deixa rasto antes mesmo de se firmar.

Como alguém que se aproxima ao longe e tem um cheiro demasiado forte para passar despercebido. Um aroma tão fétido que cria repulsa a toda a gente, mas a que o desgraçado premiado para o ver sentar-se a seu lado não pode fugir.

É o fim. O insuportável fim de que fugimos que chega.

Eu já o tinha sentido antes. Ténue, mas igualmente repulsivo.
E sabia que me tinha dado a mão no dia em que me obriguei a roubar-te um abraço.

O derradeiro fim.
Aquele que dói e que massacra, que reduz o tamanho do mundo ao canto escuro onde me aninho e choro. E canto.

Sing me a
Lullaby 
You can't sing,
But give it a try

Stay with me,
Without you I'll die
Take me into your wings
Teach me how to fly

Miss you so bad
Where are you now?
Got to see you once more
But don't know how.

The silence you gave me,
It sounds too loud,
So don't leave me alone
In the middle of this big, huge crowd

That it's the world
Tonight

Não me lembro bem de ti.
Não me lembro do teu cheiro nem do toque da tua mão, com que cheguei a sonhar.
Não me lembro do porquê de me fazeres rir, apesar de me lembrar das palavras.
Não me lembro do que me assolava em ti e muito menos do que te fazia ser especial.

Lembro-me de cantar.
Lembro-me de ilustrar a tua partida.
Lembro-me de chorar, sem me lembrar da dor.

Mas lembro-me da letra que me acalmou.
Da letra que cantei a quem quis acalmar.
Do dia em que reapareceste e não ta cantei.

Já não eras suficientemente importante.
Deixaste de o ser quando fui forçada a abraçar-te.

22 de abril de 2013

Dezanove e catorze

Éramos só mais um casal a namorar ao ar livre naquela tarde de Primavera.
Não era mais que habitual o beijo suave que às tantas ele me dava, a minha mão sobre a dele, que por sua vez descansava algures entre o meu leve vestido florido e a minha perna. O sol e o foco de luz que fazia incidir sobre nós, as gargalhadas das crianças que brincam como banda sonora.

- Sabes, é biológica a vontade que tenho que me agarres agora e me fodas aqui mesmo, mesmo que eu não queira. O que eu quero, lá no fundo. É biológico que me excite ao pensar que me podias meter ali de quatro sobre a relva, levantar-me o vestido, afastar-me as cuecas e penetrar-me de repente, sem querer saber de onde estás ou de quem assiste. É biológica a vontade que tenho de que me agarres pelas ancas e me puxes contra ti, sem dó nem piedade. Afinal, que raio de filhos fracos ia eu ter se nem sequer força para isso o pai deles tivesse?

Ele olhou para mim como se nada se tivesse passado naquele banco de jardim. Mais um suave beijo. A segunda mão sobre a minha.

- Sabes, é humano levar-te para casa e mostrar-te quem é o primeiro a fraquejar.

15 de abril de 2013

Uma e vinte e dois

Comprei um maço de tabaco.

Sentei-me na mesa mais próxima da máquina plantada naquele café mal iluminado. Abri o maço, tirei um cigarro e passei os meus dedos nele. Brinquei com aquele frágil vício por entre os dedos enquanto me debatia com o caus que se havia abatido sobre mim.

Chamei o empregado que limpava o balcão para matar o tempo.

- Não servimos à mesa.
- Não é que esteja demasiado ocupado para o fazer. Traga-me um whisky.

Reclamou entre dentes, mas veio.
Pousou o copo na mesa, paguei com uma nota.

- Fique com o troco.

Passei os dedos no bordo do copo. Fiquei assim por meia hora.
Levantei-me com o copo cheio. O maço de tabaco abandonado em cima da mesa.
Levantei-me e saí com aquele mero cigarro entre as mãos.

Observei a maneira como o ia fazendo girar entre os meus dedos enquanto seguia pelo passeio naquela noite fria.
Cessou o bater dos saltos na calçada. Tinha o cigarro na palma da mão.

"De qualquer modo também não tens lume."

Desfiz o cigarro na mão antes de a abrir para o libertar ao mundo.
Nunca fumei. Nem gosto de whisky.

13 de abril de 2013

Vinte e três e oito

Quero fechar os olhos no sossego de um dia de nada. Enroscada no conforto da despreocupação.

Fechar os olhos e ver negro.
Ver cores.
Ver caleidoscópios.
Ver o que se vê quando se mergulha no inconsciente.

Sentir na inconsciência.
Mover-me na inconsciência.

A pele arrepiada e o movimento involuntário.
Os lençóis despidos e o frio no corpo.

O calor.
O calor que me desperta a meio da noite fresca.
O calor que me cobre e me surpreende.

A consciência de que não bate certo com o que me conta o inconsciente.
A consciência de que não está certo, mas que sabe bem.

Sinto o teu cheiro.
Não abro os olhos.
Encaixo o meu corpo no teu, deixo-me à medida das tuas mãos.

Mas não abro os olhos.
Quero sentir-te como quem sente um sonho.

5 de abril de 2013

Uma e quinze

O sol raiava o dia e o sangue raiava-me os olhos.

Ninguém compreende quem não sentiu o mesmo que nós.
A dor nas escolhas, na consciência. O orgulho de sobreviver com a cruz às costas.
O cansaço.

As noites revoltas na cama, os dias mortos, o corpo amorfo.

A necessidade da adrenalina. Do bater do coração.
Dos erros desejados, dos perdões impossíveis, dos objectivos inalcançáveis.

Da carne. Do sexo. Do corpo marcado.
Da cama, do chão, do canto qualquer onde um grito de prazer afoga os gritos de dor que a alma carrega.

Por mim podia ser até num beco fedido.
De qualquer maneira, já estou fodida. E é tudo o que me apetece ser agora.

É o meu último consolo.

31 de março de 2013

Dezassete e cinquenta e dois

E ela, via-se, estava destruída por dentro.
As lágrimas secas no rosto, a busca desesperada por uma solução expressa na força com que agredia o teclado.

Não, ele não podia desistir.
Porque desistir é a única coisa que ela não sabe fazer, a única coisa a que não se permite.
E ele não pode desistir por ela, sem chance, sem solução.

Não seria só o fim deles. Seria o fim dela enquanto a mulher que sempre foi.
O fim... o fim só pode vir quando é a única opção.

24 de março de 2013

Dezanove e cinco

Passei a noite a alucinar.

Não sei se de febre, se do bloqueio de que sofriam as minhas vias respiratórias, se da ansiedade de saber que não ia poder descansar ao fim da noite ou se da vontade de ser salva. De ser resgatada e transportada dos meus lençóis para os teus.

Mas sonhei acordada, acho.
Que eu, imobilizada na cama, pelas dores e pelo cansaço, era tratada por uma enorme população de gente pequenina e amigável. Eles tinham um objectivo, que nunca percebi bem qual.

Quero acreditar que era levar-me até ti. Ou tratar-me como tu tratar-me-ias.

14 de março de 2013

Duas e quarenta e três

Talvez não sejam só coisas más.
Não seja um constante sentimento de vazio, de insuficiência, de impotência, de cegueira, de distância.
Não.

Talvez seja mais que isso.
Talvez seja o espaço para respirar e planear, sentir a saudade que só chama quem importa, perceber a ausência de detalhes em que mal havíamos reparado.

Há espaço para mais.
Para entender a vontade que permanece depois de quase esquecido o toque, de conversar mais, de conhecer mais, de compreender mais.

E de ceder mais.
Porque o que te faz entender é o braço que, constantemente, dás a torcer.
Sem dor, mágoa ou ressentimento. Sem pedido.
Com vontade. E com amor.

A distância levou-nos por caminhos que provavelmente não teríamos percorrido na presença.
Por caminhos onde, quase sozinhos, os planos se desenham, ao sabor das convergências e divergências, do desejo de ter, do desejo de proteger, do desejo de ser protegido, do desejo de se ter ao lado alguém querido. Um amigo. Um confidente.

Provavelmente, se cá estivesses, já eras passado.
Uma cama quente, umas semanas perdidas, mas agradáveis.

Talvez ainda fosses a melhor pessoa que conheço ou pensei conhecer.
Porque conhecer-te, só percebi mais tarde, havia de ser muito mais difícil que o parece.
Conhecer-te exige o tempo de quem se dedica a abrir aos poucos um cofre fechado a sete chaves.
Conhecer-te exige a simplicidade de espírito necessária para desconstruir o complexo.

Talvez ainda fosses o melhor homem que passou pelas minhas mãos.
Mas não serias o homem da minha vida. O que me fascina, cativa, reconquista entre os altos e baixos.
Porque isso... Isso só o foste realmente depois de eu te conhecer e compreender.
Como sei que nunca mais outro alguém o fará.

11 de março de 2013

Vinte e duas e quarenta e um

Gosto dos pontos de rotura que me pertencem.
De ter o poder nas mãos, de ser eu quem dita um início, um fim ou uma continuação.

Gosto. Gosto de ter o que quero, de decidir o que acontece e manter-te consciente disso.
Porque não é preciso dizer-te meu, nem é preciso marcar posição, nem é preciso ser dominante.
Basta saberes que é ou não é.

19 de fevereiro de 2013

Vinte e uma e treze

Bato a colher na chávena depois de mexer o café, antes de a pousar no pires.

- Sabes... Eu não sou como as outras. Não estou à procura de um príncipe encantado nem preciso de um homem que me salve. Pelo contrário. Quero um homem que me leve à perdição. Que saiba mexer comigo ao ponto de eu me perguntar quem sou. Que me faça quebrar barreiras. Que me trate como uma mulher, não como uma criança. Os príncipes encantados deviam ser o pai de meninas, não o amante das mulheres.  

Calo-me por um segundo, perscruto-te o olhar. Dúvida, curiosidade, provocação.
Não te dou tempo para questionar.

- Dá-me um beijo, paga a conta e vamos embora. É a última oportunidade que te dou.

12 de fevereiro de 2013

Dezassete e trinta e sete

Parece-me noite.

Não sou grande apreciadora de vinho, mas provavelmente não recusava um copo se mo oferecessem.
Talvez fizesse a espera parecer mais sofisticada. Ou mais desesperada.
Talvez dependa do valor do nome da garrafa. Cara para uma dama requintada, barata para uma bêbeda desamparada.

Não. Esta é uma tarde propícia a velas vermelhas e a lâmpadas desligadas.
Desligar a televisão, o telemóvel, ligar o rádio e fechar os olhos.

Continuo à espera, mas espero sóbria. Calma.

Afogo-me nos lençóis em busca do teu aroma há tanto tempo apagado.
Hás-de chegar.

Um dia.